sábado, 3 de junho de 2017

CONTRATAM-SE DOUTORES E MESTRES


Um Vento de Poeira Ameaça a Educação Superior do Brasil.

Altair Sales Barbosa

Um anúncio publicado nos meios de comunicação expressa: Empresa de porte médio está contratando doutores, mestres, especialistas e até graduados, em diversas áreas do conhecimento, para trabalho na capital e interior. Não se exige como pré-requisito o conhecimento específico da área, mas é obrigatório, no ato da inscrição, apresentar a titulação legalizada pelos órgãos competentes.

Os profissionais serão selecionados por uma banca examinadora composta por doutores. A banca levará muito em conta o conhecimento generalista do candidato e o compromisso de que em nenhum momento irá questionar ou desobedecer às ordens e procedimentos de seus superiores.

Os serviços a serem contratados serão oferecidos e desenvolvidos na forma de aulas, para faculdades, universidades e até escolas fundamentais.

Os interessados deverão enviar seus currículos para a empresa Curral Fechado, Rua Ponta do Círculo s/n, CEP:000 000 – 000.

O anúncio, quando publicado causou surpresa em muitos e preocupação em alguns, parecia tratar-se de brincadeira, mas na realidade era o prenúncio de encruzilhadas pelas quais guiavam algumas instituições de ensino do Brasil, especialmente as de ensino superior.
        
As aulas foram se tornando vazias e abstratas. As universidades por sua vez, foram abandonando e burocratizando a digna tarefa da pesquisa, eliminando seus bacharelados e recheando suas licenciaturas com conhecimentos pedagógicos duvidosos e desonestos para com as novas gerações, já que os conhecimentos divulgados foram-se desvinculando de compromissos éticos, morais, culturais e científicos. 

O professor na sala de aula, passou a exercer a função de difusor de conhecimentos generalistas, recheados de informações colhidas nos meios de comunicação e na mídia virtual. Os alunos, como figuras mutiladas e degradadas, quando formados, seriam jogados numa arena para uma competição global, semelhantes a bêbados brigando num “pula-pula”.

Esse modelo seria o paraíso para aqueles que querem aniquilar a alma da universidade, que é a pesquisa científica, a produção de conhecimentos. Esses tipos de dirigentes nunca entenderam os diversos meandros da pesquisa, tanto de campo como de laboratório, nem sequer suas consequências, para a busca de respostas concretas que a sociedade atual exige. Imbuídos de paradigmas ultrapassados, buscam na força do poder e na implantação do medo o respaldo para suas atitudes.

Pesquisadores e intelectuais que não se formam por decretos, e sim pela competência e experiência, são pessoas que pensam e fazem cultura, são conscientes, críticas e até “chatas” para quem não suporta a crítica, foram aos poucos desvalorizados pelas estruturas nebulosas que começaram a reger a academia.  O modelo de terceirização foi permitindo que esses pensadores e fazedores de cultura e também críticos, fossem substituídos por grupos emergentes de profissionais terceirizados que se agarram com seus dirigentes, feito parasitas, dando-lhes a força necessária para continuarem remando suas canoas por águas calmas que passaram a refletir uma imagem macabra, na linha melódica do dizer do poeta:

“... é que Narciso acha feio o que não é espelho,
e a mente apavora o que ainda não é mesmo velho,
nada do que não era antes quando não somos mutantes.”

A terceirização do ensino é uma saída miraculosa para alguns dirigentes que não tem compromisso para com o futuro do país. Acabam os problemas com as ausências eventuais, pois a empresa terceirizada teria que colocar imediatamente um substituto. Economizam na compra de equipamentos laboratoriais, já que as aulas práticas e as pesquisas não existiriam mais. Restaria um ou outro laboratório sucateado. Acabariam os problemas de negociação salarial com as associações representativas de classe. A quantidade é fundamental para substituir a qualidade.

Num passado não tão distante o anúncio soaria como ficção, no entanto, hoje já se tornaram realidade em vários rincões do Brasil, portanto aquelas pessoas que se julgam verdadeiros educadores, comprometidos com o futuro, não deixem que suas gerações herdem um mundo desumano e excludente, façam o que tiverem ao alcance para que o vento de poeira, não se transforme numa tempestade avassaladora. Se porventura esta situação vier acontecer, será o fim, e de vez, será sepultada a pedagogia da esperança. Uma universidade verdadeira tem diante de si um imenso papel profético de continuar formando e oferecendo elementos pedagógicos e científicos que permitam o surgimento de opiniões desprovidas dos preconceitos e preocupadas com o futuro. Porque a educação sadia, sedimentada em princípios éticos, é o único processo através do qual o ser humano conquista sua liberdade e constrói sua felicidade. 




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